Orra essa faz miliano e
veio em minha memória apenas agora. Ainda na infância, minha coroa conseguiu me
matricular em uma escola pública central. Onde a maioria do período da manha
era filho da burguesia, do morro até lá dava uns três quilômetros na sola. E criança
tem aquela inocência de não entender muito bem o mundo dos adultos,
principalmente as maldades.
Tinha um colega de sala que era muito mais rico que os
demais. Um dia me convidou pra colar na sua casa, ou melhor, seu castelo. De
bobeira em um sabadão colei no casarão fincado no centro da cidade, naquele naipe:
Chinelo havaianas, bermudinha surrada e camisa esfolada ganhada da patroa tia.
Ali conheci um mundo distante do meu, dezenas de cômodos a se perder de vista.
Todos, mas todos os brinquedos que eu via nas propagandas da TV, o Júlio era
gente fina, também não entendia o egoísmo dos adultos.
Ele deixava brincar com todos os brinquedos e ali passávamos
horas criando batalhas imaginárias que nem percebíamos o tempo passar. Recordo de
levar um matchbox – aqueles carrinhos de metal
gringos que vinha em uma caixinha de papel- todo zuado, porém mais ligeiro que
os centenas da coleção dele. Rolava aquela desconfiança de que eu poderia ser
mão leve. E antes de guardarmos, os brinquedos eram severamente conferidos. - Crianças venham tomar café! A empregada me
viu colocar um carrinho no bolso e logo caguetou pra patroa. – Menino me deixa
ver o que você tem no bolso? Se você quiser algo é só pedir, é feio fazer isso.
Logo desandei a chorar sem parar, sinistro com a mão no bolso, sem soltar uma
palavra. – Mamãe me deixa explicar: Ele não roubou nada, o que esta no bolso
dele é o carrinho mais veloz de todos, é dele e ele me empresta para brincar.
Putz ai ficou aquele
climão tenso e constrangedor demais. – Come mais, olha tem geleia, suco,
torrada, bolo, refrigerante, doce, pipoca. – Não quero nada! Quero ir embora. –
Então vamos jogar videogame? Andar de Bis’creta? Assistir vídeo cassete? Cai na
real que ali não era o meu lugar, que não deveria mais voltar. Ofereceram até
carona de volta, talvez para amenizar a mancada e tirar o peso da consciência por
desconfiar da inocência de uma pobre criança.
- Vou nessa, agenti si vê na escola. Deu’zica e aqui não
colo mais! Fica com o carrinho pra você. Lá no morro nóis joga bola com golzinho
de chinelo, taco, balança caixão, peão, pique esconde, bolinha de gude, bate
figurinha, esconde-esconde, mãe da rua, telefone sem fio, passa anel,
pega-pega, soltar pipa, peteca, pula sela, pular corda, queimada mais uma pá de
brincadeira. Fica de barriga vazia, mas nenhuma tia dá geral pensando que nóis
é ladrão. Falô ai, Valeu.
Joey
é escritor autodidata.
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